Usando as métricas para melhorar
Peter Drucker foi um escritor, professor e consultor tido ainda hoje como o pai da administração moderna que, apesar de nascido no século passado (1909), em Viena e falecido em 2005, ainda nos instiga com muitas lições preciosas.
Uma das suas citações mais conhecidas é a de que: “Se você não pode medir, não pode gerenciar”, a qual remete para a complexidade de administrar qualquer atividade sem uma métrica, sem conhecer de forma clara, objetiva, profunda e científica tudo que possa afetar e contribuir para o resultado final.
E praticamente todas as finalidades das pesquisas quantitativas de mercado e de opinião têm como objetivo a realização de alguma forma de medição, seja de satisfação, de rejeição, de preferências, de propensão ao consumo, de entendimento da mensagem, do clima organizacional, ou outra hipótese qualquer.
Ocorre que a complexidade dos produtos e serviços, do mercado, da concorrência, da tecnologia, das mudanças em andamento, dos impactos acarretados, e outros fatores dificilmente pode ser explicada com apenas um simples percentual de respostas ‘sim’ ou ‘não’, de quantidade de notas ‘10’ ou ‘0’.
Fugindo do lugar-comum
Cada vez mais novas métricas se fazem necessárias para alcançarmos uma compreensão minimamente satisfatória das situações sob análise, o que exige que a ‘criatividade’ e a ‘originalidade’ sejam mais empregadas para identificar as melhores formas de se medir qualquer que seja o objeto da investigação.
Pessoalmente me fascina toda nova métrica que possibilite explicar os fenômenos avaliados, ao mesmo tempo em que me incomoda terrivelmente não haver pensado antes nessas abordagens diferentes enquanto formas medição.
O fato é que, depois de aplicadas, as novas métricas (quando boas) passam a se tornar indispensáveis para a tomada de decisões e suscitam a indagação sobre como era possível tomar uma decisão sem essas informações?
Uma das fontes de inspiração que considero das mais interessantes no que tange às métricas são os esportes profissionais, principalmente pela necessidade desses indicadores de serem claros, de fácil entendimento e de possibilitarem uma interpretação imediata.
Mas o mais entusiasmante é o fato dessas métricas mais ‘elaboradas’ já trazerem em si mesmas o próprio ‘caminho’ das soluções ou a forma sobre como resolver os problemas ou se tomar a decisão empresarial mais apropriada.
Assistir a um jogo de vôlei atualmente implica em um mergulho nas métricas de todos os fundamentos (saque, bloqueio, passe, levantamento) e na forma como essas estão se comportando ao longo da partida quanto ao melhor pontuador(a), a quantidade de aces, a melhor defesa, o número de bloqueios, o índice de aproveitamento, de recepção, o melhor levantador(a), entre outras.
Até mesmo no futebol, quase sempre um esporte muito lento em se atualizar, números sobre chutes a gol, das situações de perigo criadas, sobre a distância percorrida em campo pelos jogadores, os mapas de calor das posições ocupadas, quanto ao tempo de posse de bola, as faltas cometidas & sofridas, os passes errados, os impedimentos, os escanteios, entre outras já fazem parte das transmissões e facilitam uma visão e o ‘entendimento’ da partida.
O tênis, em especial, é uma modalidade esportiva onde as ‘novas’ métricas constantemente estão sendo criadas e cada vez mais explicam o desempenho dos jogadores, os resultados das partidas e as particularidades de cada campeonato ou do piso em si.
As jogadas vencedoras, os erros não forçados, as quebras de saque, os pontos ganhos com o 1º serviço, as velocidades das bolas e dos serviços, os pontos ganhos em bolas com mais de 5 trocas, os pontos ganhos na rede, os locais na área do serviço onde os saques ocorreram, a distribuição das bolas pela quadra entre outras passaram a ser informações disponíveis na maior parte das transmissões, algo que sequer existia há alguns anos.
A referência em inovação
Mas possivelmente o basquete, em particular a NBA, para mim seria o suprassumo do emprego das métricas, seja pela sua diversidade quanto pela sua criatividade e constante evolução e busca de explicações para os desempenhos, os resultados das partidas, dos times e dos jogadores.
Além das estatísticas básicas dos fundamentos da modalidade (passes, arremessos, lances-livre, cestas de três pontos, rebote) que já há algum tempo fazem parte da análise por parte dos aficionados, as novas avaliações que vêm sendo ‘criadas’ possibilitam uma visão bem mais holística do jogo em si.
O triplo-duplo ou duplo-duplo (quando o atleta consegue um número de dois dígitos em três ou dois fundamentos, ou seja, 10 pontos ou mais pontos, assistências, rebotes) em conjunto com o tempo de quadra, a pontuação dos jogadores reservas, o número de turnover (perda de bola), e outras métricas proporcionam uma dimensão completamente nova do jogo em si e das estratégias colocadas em prática pelos treinadores.
A comparação sempre à mão dos comentaristas dos dados históricos, das diversas temporadas, dos indicadores dos demais atletas (em atividade ou já aposentados) e das demais franquias são de uma riqueza incrível e um prato cheio a embasar qualquer ‘decisão’.
Inquietude na busca pela precisão
A lição que fica para quem atua na área de pesquisa de mercado e de opinião ou na busca de insights seria a de que é fundamental manter a nossa mente sempre aberta às novas oportunidades, às novas possibilidades existentes (e ainda não percebidas) ou às oferecidas pela tecnologia, pelas ferramentas de software, pela inteligência artificial ou qualquer outra forma que possa ser aplicada para melhor explicar o problema em análise, seja um novo produto ou uma situação qualquer.
Essa inquietação permanente com relação à busca incessante sobre novas formas que sejam diferentes, criativas e inovadoras para se medir qualquer coisa deveria ser uma preocupação de todos que se envolvem com a atividade.
De modo a se alcançar formas de medição mais precisas, mais rigorosas e que melhor expliquem comportamentos, escolhas, percepções não deveria jamais bastar a mera repetição de formatos já conhecidos ou a simples comparação com a série histórica.
Hoje a tecnologia contribui e facilita em muito esse trabalho de ‘busca’, do ‘manuseio’ e do ‘manejo’ das informações primárias, desde que exista a predisposição em se ‘cavar’ mais fundo, em cruzar as variáveis aparentemente sem ligação entre si, em confrontar com outros dados secundários ou (principalmente) de estudos anteriores disponíveis.
Não deveria bastar somente medir a nota da satisfação atual, mas sim investigar se a mesma varia em função do tempo de utilização, ou se o conhecimento dos produtos do concorrente impacta essa percepção, até onde as características sociodemográficas de quem faz uso se manifesta nessa avaliação, em que medida a chegada de novos players é refletida no indicador, o quanto a familiaridade com o digital e com a tecnologia são relevantes e por aí.
O mais importante seria, portanto, não se acomodar e nunca se dar por satisfeito com as métricas tradicionais e já sobejamente conhecidas que nem sempre podem explicar as mudanças em curso, ou pior não oferecerem pistas suficientes para a construção da solução esperada pelos clientes que nos propomos entregar.
Ricardo Luiz Checchia
Engenheiro, sócio da Checon Pesquisa,
Membro da Esomar e conselheiro da ABEP – Associação Brasileira das Empresas de Pesquisa